Diariamente a mesma sensação. Ou melhor. Toda noite. Não há horário fixo,
nada previamente estabelecido. Mas ao deitar a cabeça no travesseiro, já sei que
serei acordado para cumprir minha missão. Antes mesmo do alvorecer. Meu
psiquiatra preferido, aquele que ainda vive, diz para eu me ater aos fatos. “Não
se deixe levar pelo impulso. Beba um copo d’água e volte para a cama”. Não bebo
água. Mas tenho sede de vingança. Toda santa noite. E sempre o mesmo epílogo.
Geralmente acontece por volta das 3h. A TV antiga de tubo do meu quarto, ligada
até antes de me deitar, estala como um tiro, ao resfriar com a brisa das
montanhas. É o estopim para mais um martírio. Entre a aflição e o desejo, levo
adiante mais uma perseguição. É chegada a hora de encontrar a próxima vitima.
Não vou longe. A noite fria desmotiva até o mais ardente matador. Mesmo
com o clima ameno, elas estão ali. Como se em um desejo inconsciente de serem
atacadas e serem saciadas pelo prazer do sofrimento. Geralmente
é jogo rápido. Ele ou ela (tampouco me preocupo em diferenciá-los), até tenta
escapar, mas não resiste ao golpe único. Anos de uma vida infernal me brindaram
com uma precisão cirúrgica. O golpe frio ecoa pelas sombras noturnas enquanto me
delicio com a visão daquele corpo imóvel. Amassado.
Religiosamente recito o mantra póstumo: “Sangue do meu sangue. Ninguém
pediu para você cruzar o meu caminho. Agora siga o seu, em outro plano. Longe
de mim. Longe dos meus pensamentos. Longe dos meus sentidos”.
Lavo as minhas mãos. Literal e metaforicamente. Volto para a cama. Realizado. Certo de que não existe prazer maior do que acabar com a raça daquele pernilongo filho da p... .